A CPI dos Pancadões: mais um abuso aos Cidadãos
- Ana Paula Arendt

- 22 de out.
- 13 min de leitura

A CPI dos Pancadões: mais um abuso aos Cidadãos
Ana Paula Arendt*
Para todos os MCs do Brasil e do mundo. Para o XI de Agosto.
“É uma experiência eterna de que todos os homens com poder são tentados a abusar.”
- Barão de Montesquieu
Fiquei surpresa ao encontrar no feed de notícias um funkeiro, MC Prof. Dr. Thiagson, dando aula de música a um vereador desconhecido de São Paulo, ensinando-o a pronunciar corretamente Bach e Debussy. O político tentou intimidá-lo citando grandes nomes da música de concerto, sem saber pronunciar os nomes deles (certamente nunca tocou suas partituras, nem os ouviu). Queria o fulano político imprimir e nos convencer que a música do MC famoso seria prejudicial ao espírito dos jovens, incentivando neles a violência. Sem dúvida foi um ato de humanidade e benevolência da parte do MC Thiagson, professor e doutor pela USP, enquadrar a ignorância do político, citando uma obra atual de Burke/Cambridge sobre a ignorância. Mais um episódio corriqueiro da surrealidade desses embates políticos predatórios, que buscam ampliar a exposição, com recurso ao absurdo, com pouco ou nenhum debate, reduzido à incompatibilidade de opor-se…
Contudo o Cidadão, assim como eu, passando o feed rapidamente, já desinteressado e em busca de outro tema, de repente pára. Convém pensar, ficar com a pulga atrás da orelha: espera, volta tudo. Vamos ver de novo! Qual seria o motivo para um vereador de São Paulo questionar a qualidade da música de MCs paulistas, durante uma audiência pública de CPI, um mecanismo legislativo de investigação contra crimes, sem ter nenhum – absolutamente nenhum – conhecimento musical? (E ainda que tivesse qualquer conhecimento.)
Entrando no portal da Câmara Municipal de São Paulo, os Cidadãos, leitores e amigos poderão encontrar a seguinte justificativa:
“Nesta quinta-feira (16/10), os vereadores que compõem a CPI (Comissão Parlamentar de Inquérito) dos Pancadões se reuniram no Plenário 1° de Maio para dar continuidade aos trabalhos O colegiado tem entre os objetivos apurar a realização de festas clandestinas na capital paulista.
No encontro desta quinta, os parlamentares da CPI aprovaram um requerimento e receberam o professor de música Thiago Barbosa Alves de Souza – conhecido como Thiagson, e o rapper e influenciador digital Fábio Gabriel Araújo Salvador – o Salvador da Rima.
A influência das músicas de funk no comportamento das pessoas e na apologia ao crime foi uma das principais questões discutidas na reunião. Outro ponto do debate tratou da relação do estilo musical com o uso de dr0gas. Presidente da CPI, o vereador Rubinho Nunes (UNIÃO) disse que a “narcocultura” está presente nos pancadões, já que as composições falam da criminalidade. (…)
O rapper Salvador da Rima também prestou depoimento. Ele foi questionado pelo vereador Sargento Nantes (PP) – integrante da CPI. O parlamentar citou letras de músicas de autoria do cantor que falam sobre a ostentação de armas e a marginalização das mulheres. “É normal para o senhor chamar as mulheres de cachorras?”.
O influenciador digital respondeu à pergunta de Nantes. “Cachorra é um termo que você está colocando para se referir a todas as mulheres. Tem mulher que não gosta de ser chamada assim, mas tem mulher que tem orgulho de ser. Infelizmente, essa é a realidade que a gente vive. Isso não denigre e nem generaliza a todas as mulheres”, afirmou Salvador”.
Aparentemente, as festas privativas de cidadãos agora são “festas clandestinas”. O que é uma festa clandestina? Uma festa não autorizada pelo poder público? Uma festa privativa deve ser autorizada antes pelo poder público? É o nível de loucura que parece ter atingido esse grupo de vereadores, em uma sociedade indiferente, que os deixou sem freios.
A pergunta imediata que se coloca é: por que as festas desses meninos funkeiros precisam ser autorizadas pelo poder público, e as festas da nata política de São Paulo, onde sabemos há uso e abuso de dr0gas, não têm de ser autorizadas? Por que os amigos deles e empresários, que promovem as festinhas em que se decidem os contratos e nomeações, não estão também depondo nessa CPI? Ora! Não houvesse uso de dr0gas nas festas dos amigos ricos desses vereadores, nem na alta sociedade paulsita, as clínicas de reabilitação mais caras de São Paulo não teriam tantos clientes. Quem é da Pastoral da Saúde talvez possa ter um retrato ainda mais acurado.
De todo modo, é uma intromissão assustadora na vida privada dos Cidadãos, para não dizer surreal: o poder público, incapaz de lidar com a prevenção, combate e tratamento ao uso de dr0gas, resolveu colocar a culpa de sua incapacidade na melodia e na letra das canções tocadas durante essas festas… Fez uma CPI… Para debater letra de música em festa… E isso foi autorizado por diversas autoridades públicas! Por assessores obedientes… E se me disserem esses assessores que acharam também um absurdo, mas que seriam demitidos, se recusassem a trabalhar nisso: conviria uma carta, com rubrica do delegado de plantão, salientando a inconveniência de tomar parte em algo ilegal, para reservar o recurso ao direito de consciência.
É lógico que todo ser minimamente racional iria olhar para essa CPI como inconstitucional e, portanto ilegal – haja vista a que a Constituição existe para defender a liberdade de expressão artística, incluída aí a liberdade de fazer composições musicais. Para não reclamar do mau uso de recursos públicos: nenhuma autoridade tem o direito de usar de seu cargo ou de recursos públicos mobilizados por seu cargo para causar danos aos cidadãos, para intimidar, interferir ou produzir juízos prejudiciais sobre trabalhos artísticos, nem para tratá-los como inimigos públicos, ou colocar cantores e compositores no escrutínio público sob suspeita de ser colaboradores dos narcotr4ficantes, fora do devido processo legal disso.
Ora, então eu que sou mulher, católica de ir à missa, catequista, sou então a favor de funk, de músicas que objetificam as mulheres? Pois é justamente o contrário do que esses políticos querem fazer colar… Analisemos mais profundamente o que incomoda tanto esses vereadores que se dizem conservadores! Talvez eles se incomodem porque, sendo eles as autoridades que desejam monopolizar a definição do que é uma mulher “pura e decente”, os artistas em questão lhes tenham privado desse papel masculino glorioso.
Quando uma mulher é valorizada numa composição musical independentemente de atender a um critério de virtude de “pureza”, e quando são ignorados os quesitos que uma “sociedade de bem” determina, é lógico que esses homens de gravata perdem completamente o controle que desejam estabelecer sobre as mulheres. Se as mulheres podem ser valorizadas e homenageadas em letras musicais, mesmo tendo sido condenadas pela “alta sociedade” à pecha de um papel degradado, mas continuam desejáveis e são exaltadas como “cachorras”, perde a eficácia o poder que deseja dizer qual é o valor delas. A homenagem à mulher degradada, independentemente do seu comportamento sexual, destrói o machismo e o mundo misógino dos homens retrógrados, chauvinistas, que se escondem detrás dos seus “poderosos” cargos, com que ameaçam expor as mulheres na sociedade como inadequadas. Em geral, são também aqueles habituados a ameaçar os cidadãos em geral com onerosos processos judiciais e administrativos… Sendo os homens de terno e gravata sabidamente aqueles mais frequentadores de pornografias, patrocinadores das garotas de programa eslavas, das esposas de luxo compradas em contrato conjugal: isso sim uma objetificação prática das mulheres.
Essas letras do funk talvez os incomodem porque acabam com a possibilidade do homem se achar no direito de atribuir ou desatribuir valor monetário e de mercado a elas. “Foda-se essa moral hipócrita do recatamento”, se a falta de recatamento torna uma mulher menos desejável: é o que no fundo dizem os funkeiros, sendo aliados da liberação feminina. Pois a desembargadora Berenice Dias bem assinala: as mulheres têm direito ao prazer sexual. E se a exaltação delas, mesmo degradadas, aumenta o prazer sexual delas, permite que elas se aceitem, e se há mulheres que querem ouvir isso, o que os vereadores de São Paulo têm com isso?
Entretanto é inacreditável que uma autoridade pública, em pleno século XXI, venha a querer dizer o que as mulheres devem escutar ou não devem, nas canções de festas e baladas, presumindo isso influenciaria como devem ou não devem se comportar, o que elas devem ouvir para sentir prazer… Ora, e mesmo se o vocabulário musical depõe contra a moral e os bons costumes, quem são esses vereadores, para sair pregando por aí moral e bons costumes? Acaso são bispos e arcebispos castos, são homens que têm pensamentos puros…?
As mulheres que decidam se querem ou não ouvir! Se querem ou não estar em uma festa onde se ouvem tais músicas… Por que um vereador, ou uma CPI de vereadores, tem que decidir a música que as mulheres ou quaisquer pessoas ouvem? Eu não gosto, e prefiro o meu estado pacificado há muito, mas se há mulheres que gostam, quem sou eu para julgá-las? Se o Papa, os bispos e arcebispos, se quem observa verdadeiramente a castidade não as julga… De onde tiraram esses políticos que teriam autoridade para julgar essas mulheres, e esses MCs? Mais parece um comportamento de seres estranhos, ratificados em bestiário medieval: querer controlar quais as canções devem ser tocadas em festas privativas… Seria, ainda, um insulto aos medievais: sendo a canção medieval mais famosa, Greensleeves, uma declaração de amor a uma prostituta. Não encontro nem mesmo da parte da Inquisição qualquer taxatividade contra essa música: e se houve, ninguém deu bola, pois a canção sobreviveu ao teste dos séculos: até uma prostituta pode ter o privilégio de ser amada.
É lógico: por essa mesma razão Cristo foi odiado. Ele reabilitava as prostitutas, tratando-as como pessoas dignas, fazendo-as nada menos desejáveis do que as outras mulheres. O resultado é que as mulheres que acompanhavam Cristo não mais viviam temerosas sobre cada detalhe do comportamento e da vestimenta, do escrutínio público. Conhecendo a própria dignidade, aprenderam que nenhuma conduta sexual, mesmo imoral, jamais seria pretexto para a autoridade maior, Cristo, diminui-las. Por isso os fariseus odiavam Cristo: pois Ele fazia cumprir a palavra, e com isso esvaziou o poder daqueles homens mesquinhos. Agora esses vereadores que se dizem cristãos fazem o mesmo: odeiam na verdade Cristo, porque desprezam os funkeiros que exaltam as mulheres e as declaram desejáveis, independentemente de qualquer juízo moral sobre seu comportamento.
Vejamos também a hipocrisia: pois os concertos clássicos e mesmo a Igreja estão cheios de homens que acham o matrimônio seria um vínculo conjugal bonitinho, um apetrecho mágico para dispensar o consentimento. Ora, então o que faz esses maridos religiosos diferentes de funkeiros que, presumem os críticos, não pediriam antes o consentimento da mulher? Nada. Entretanto, sabemos há funkeiros que pedem, sim, o consentimento das mulheres, antes de se dirigir a elas. Prova disso é a declaração de soberania feminina do MC Thiagson nessa audiência da Câmara Municipal, quando afirma que nem todas gostam, “mas algumas gostam”. Ora, então eles estão atentos ao que elas gostam, e ao que elas querem, antes de entregar palavras e a si mesmos. Nisso um funkeiro se revela certamente mais digno do que o marido religioso cobrando a mulher cumpra seus deveres conjugais, obrigando-a a fazer algo quando se encontra indisposta, ou que acha não precisa do consentimento da mulher. O estupro conjugal é um problema pastoral frequente das crises de casais e não mereceu ainda suficiente atenção nos estudos teológicos.
E quanto às letras que incentivam uso de dr0gas, armas e crimes? Bom, então deve-se proibir que sejam exibidos filmes em Hollywood sobre guerra, sobre gângsteres? Anula-se então o alvará de assistir aos filmes de Al Pacino e Robert de Niro, os roteiros de Francis Ford Coppola devem ser alvo de indagações e questionamentos sobre apologia ao crime? Uma família nem jovens podem ir ao cinema ver esses filmes, em achar nesse lazer diversão? Vão proibir a venda do romance de Mário Puzo, já que romantiza a máfia e o gangsterismo, e que efetivamente causa grande dano à formação?
Também deve incomodar que os funkeiros tenham encontrado uma profissão digna, em ser MCs. Encontraram emprego por si próprios e prestígio junto ao público; e não às custas do Estado, num cenário em que o poder público se empenha em concentrar para si todo o poder glorioso de gerar empregos, de controlar o que é ou não profissão digna de receber a atenção da sociedade… Os bandos de corruptos dedicados a inconstitucionalidades querem ser aqueles que ocupam o último degrau na vida pública, querem se dizer modelo para os demais, ditar os bons valores e bons costumes, quando são justamente os que menos observam a legalidade e o respeito à dignidade do outro…
Ora, eu não sou fã de funk, nem das canções modernas! Prefiro muito mais Pixinguinha, Vinicius de Moraes, Noel Rosa, Tom Jobim, e sim, a música de Bach, Debussy, Halvorsen, Hasselman, Sidney Bechet, Georges Brassens, Edith Piaf, a música que se pode ouvir enquanto se tem o privilégio da conversa. Sou poeta sonhadora do amor escasso… Não calha de despertar meu interesse o que é proibido. Choca-me muito que a geração dos meus filhos ache o funk a música preferível em uma balada, mas: são uma expressão autêntica da vida nas periferias, como foi outrora o samba; e é claro que eu fico feliz quando eles se divertem de um modo inclusivo saudável, recusando os excessos.
Mas de uma questão de gosto pessoal, chegar a acusar um estilo musical, dizer que música versando sobre a temática sexual e sobre a realidade da vida dos jovens nessas áreas degradadas poderia incentivar o uso de dr0gas? Poderia-se dizer, então, que a poesia de Vinicius de Moraes incentivava a obesidade, já que “não provaria da alface a pétala”? (Como se explica então que as esposas dele comiam salada, ouvindo-o o dia inteiro?) É algo ridículo demais para ser considerado, que a esfera artística, construída sobre as bases da imaginação e da fantasia, tenha de ser regulamentada pelo poder público. É inacreditável ver uma CPI gastando dinheiro do nosso bolso e dedicando-se a isso…
Além de que todo agente público que acha o Estado teria o direito de interferir no conteúdo da produção de um artista se torna um verdadeiro pregador do comunismo, em substância e forma. Aliás minto e peço desculpas, pois comparar esses vereadores aos piores comunistas seria um insulto aos comunistas: nem o Partido Comunista Chinês, que é o partido comunista mais poderoso em nosso tempo, jamais convocou Haizi a prestar justificativas, nem ficou tentando avaliar as letras de versos que ele publicava…
Convenha-se ainda falar mais dos músicos clássicos, os quais raramente eram dados a grandes virtudes…! Dizer Mozart seria melhor que um funkeiro, por supostamente inspirar bons modos em sociedade? Isso esbarra no registro histórico, sendo o maior gênio da música clássica um sujeito tão devasso. Mozart era um homem muito fora da curva da sociedade vienense conservadora de sua época, e colocava toda a volúpia do seu comportamento sexual nos arranjos rebuscados. Ouvir e tocar Mozart, nesse raciocínio, acaso é apologia à devassidão?
E Tchaikovsky? Então estaríamos construindo uma sociedade de homens frígidos, sexualmente introversos, ao ouvir Tchaikovsky, o compositor que não conseguia dormir com a própria esposa? Os russos, que em sua maioria ouvem Tchaikovsky abundantemente, teriam se tornado frígidos, ao ouvir as composições delicadas de Tchaikovsky, rechaçando sua mulher? Esses vereadores deveriam dizer isso a Vladimir Putin, o modelo de masculinidade dos russos. Sim, isso precisa ser elevado ao conhecimento dele e, por que não? Também aos nossos generais brasileiros que ouvem Tchaikovsky…. Eu adoraria ver a reação de homens de verdade acabando com a imbecilidade que se instalou na Câmara de Vereadores de São Paulo, lançando um ataque mais apropriado do que a minha débil escrita feminina, para acabar com esse esgoto de ilegalidade e preconceito contra a música feita pelos cidadãos mais pobres e excluídos. Só pode tocar “Bach e Debussy” na favela… Valha-me!
Entretanto a Câmara Municipal de São Paulo não acha essa CPI algo ilegal, inconstitucional e ridículo, aparentemente não pensa dessa maneira. Sim, é preciso respeitar a opinião diversa. Aparentemente não acham os demais vereadores que essa CPI é um escândalo, uma gigantesca idiotice. Coadunam então com seus trabalhos, não cogitam ainda vedar a continuidade de um trabalho que está ridicularizando, perante nós todos, a carreira pública de vereadores.
Cabe então a nós, que votamos em São Paulo, questionar. Por que devemos desperdiçar recursos públicos com o salário desses vereadores desocupados, que não encontraram ainda ideias adequadas ao exercício fidedigno do papel deles, de desenvolver políticas públicas mais eficazes prevenir, combater e tratar o problema das dr0gas? Cabe questionar por que devemos pagar o salário de vereadores que, sendo covardes demais para enfrentar o crime, querem ficar debatendo, proibindo e punindo estilos musicais e letras de canções…
Se nada fizermos e se nada dissermos, se nada reclamarmos estaremos contribuindo para formar uma classe política muito mais do que parasitária, muito mais do que ignorante, muito pior do que uma classe de políticos que nunca ouviu nem sabe quem é Debussy, e se acha habilitado a dar aula de música… Se nada dissermos, estaremos produzindo um viveiro de governantes estúpidos: seremos tiranizados por gente estúpida. Pois é o que estão tentando fazer: tiranizar os MCs. Diante de tanta insensatez, se nos deixarmos ser governados sem protesto por agentes estúpidos, qual juventude não ficará desiludida?
É preciso apoiar que os estudantes se levantem, a Geração Z deve enviar um representante junto ao STF e pedir a destituição imediata dessa CPI, dado que são abundantes e oficiais os registros de que desejam interferir e controlar conteúdo artístico em festas privativas. O o respeito à dignidade desses jovens da favela em suas festas e o direito de escolher a música que desejam ouvir não pode ser menor que o direito dos amiguinhos ricos e drog4dos nas festas desses vereadores.
É preciso boicotar, também, o voto na próxima eleição nesses sujeitos, ainda que existam no largo público de Cidadãos os que detestam funk. Não se trata de gosto musical: mas de recusar veementemente que vereadores exerçam um papel público imprestável! Não podemos aceitar tanto parasitismo, tanta falta do que fazer, tanta desocupação de um poder legislativo, diante do grave problema do consumo e venda de dr0gas.
Há de se rechaçar publicamente nos nossos círculos sociais a conduta maligna e intromissora de poucos agentes públicos na vida privada e no trabalho criativo desses jovens artistas. Se eles são narcotr4ficantes, e não cantores e compositores, que isso seja alvo de uma investigação policial, com direito a ampla defesa e presunção de inocência, ou que se façam perguntas sobre atividades supostamente ilegais, e não uma acareação pública sobre os aspectos artísticos de suas canções e melodias…
Sinceramente… Precisamos eleger mais homens e mulheres que tenham coragem de enfrentar e prender trafic4ntes, que trabalhem com especialistas e valorizem os policiais, que tenham inteligência ao fazer política contra as dr0gas, e não simulacros de valdevinos.
Fica também a sugestão a todos os MCs do País: valer-se da oportunidade de inspiração para criar letras com um vocabulário mais apropriado com que esses políticos devem ser tratados. Não foi assim que João Gilberto cantou “vamos acabar com o samba/ madame não gosta que ninguém sambe”? Os Cidadãos certamente vão agradecer que esses políticos sejam homenageados nas letras de funk como eles merecem.
Mas então os plantonistas me dirão, ora, não se deve pagar uma tentativa de causar dano e constrangimento ao Sr. MC Thiagson com dano e constrangimento ao perpetrador. É verdade, a fé católica jamais pregaria um constrangimento como forma de reparar constrangimento. Mas foi para o bem de preservar a fé de todos que Cristo chamou São Pedro de Satanás, na frente dos Apóstolos e o mandou para longe de Si: não para causar dano e constrangimento, muito menos para satanizar São Pedro. Mas para que São Pedro pudesse se dar conta do absurdo que estava a pregar em Seu Nome (São Mateus 16, 23-24), e, sendo ovelha mansa, ao invés de acusar e denunciar Cristo, se corrigisse.
Do mesmo modo, é necessário ojerizar quem propõe e perfaz tamanho crime de inconstitucionalidade em audiência pública, é necessário que a sociedade saiba que é um abuso do agente legislativo, querer imputar apologia ao crime em criações artísticas que versam sobre essa realidade. Para preservar a fé de todos na democracia, nos valores que a Constituição defende. Assim, pelo contrário: é muito conveniente para a fé católica que se denuncie o mal no abusador, para aumentar a consciência do absurdo… E a depender da boa obra musical que resulte: talvez eu até passe a ouvir funk…! Não seria jamais um bom servidor público quem buscasse ficar alheio ao que se passe na periferia, ouvindo Bach e Debussy, e a arte é fundamental para nos contar como estão vivendo os jovens nessas áreas.
* Ana Paula Arendt é cientista política, poeta e servidora pública brasileira.



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